Três textos por TreinadorX


 

Três textos

Autoria: TreinadorX
Originais - geral
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Trem da vida

 

A vida não passa de uma viagem de trem. Cheia de embarques, alguns acidentes. Surpresas agradáveis em alguns embarques e grandes tristezas em outros.

Ao nascermos, entramos nesse trem e nos deparamos com pessoas que julgamos estarão sempre conosco nessa viagem. São nossos pais.

Infelizmente isso não é verdade, pois em alguma estação, eles desceram e nos deixaram órfãos de seu carinho, amizade e companhia insubstituível.

Mas isso não impede que, durante a viagem, pessoas interessantes, e que virão a serem especiais para nós, embarquem. Chegam nossos irmãos queridos, amigos maravilhosos e até amores inesquecíveis.

Muitos tomam esse trem apenas á passeio. Outros encontraram somente nessa viagem tristeza. Alguns outros circularam, pelo trem, prontos para ajudar quem precisa.

Muitos descem e deixam saudades eternas. Outros, tantos, passam por ele de forma que, quando desocupam seu lugar, ninguém se quer percebe.

Curioso é constatar que alguns passageiros, que nos são tão raros e caros, acomodam-se em vagões diferentes dos nossos. Portanto somos obrigados a fazer, esse trajeto, separados deles. O que não impede que, durante a viagem, atravessemos, com grande dificuldade, o nosso vagão e cheguemos até eles, mesmo que, infelizmente, jamais poderemos sentar ao seu lado, pois já terá alguém ocupando aquele lugar.

Não importa. É assim que é a viagem desse trem da vida. Cheia de atropelos, sonhos, fantasias, esperas, despedidas. Porem jamais retornos.

Façamos, então, dessa viagem da melhor maneira possível, tentando nos relacionar bem com todos os passageiros. Procurando, em cada um deles, o que tiver de melhor. Lembrando sempre em que, algum momento do trajeto, eles poderão fraquejar e provavelmente teremos que entender isso porque nós também fraquejaremos. Muitas e muitas vezes. E com certeza haverá sempre alguém que nos entenderá.

O grande mistério afinal é saber qual parada desceremos. Muito menos nossos companheiros. Nem mesmo aquele que está sentado ao nosso lado.

Eu fico pensando se sentirei saudades quando descer desse trem. Acredito que sim, pois me separar de alguns amigos, que fiz nele, será, no mínimo, doloroso. Deixar meus filhos, sozinhos, á continuar a viagem com certeza será muito triste, mas me agarro na esperança que, em algum momento, estarei na estação central e terei a grande emoção de vê-los chegar com uma bagagem que tinham quando embarcaram. E o que vai me deixar realmente feliz será pensar que eu colaborei para que essa mesma bagagem tenha crescido e se tornado valiosa.

Amigos, façamos com que nossa estada nesse trem seja tranqüila e que tenha valido a pena e que, quando chegar a hora de desembarcarmos, o nosso lugar vazio traga saudades e boas recordações para aqueles que vão prosseguir a viagem.

 

Viva como um cachorro

 

O cachorro tem hábitos simples. Por exemplo, nunca deixe de passar a oportunidade de sair para um passeio. Experimente a sensação do vento e do ar fresco em sua face por puro prazer

Quando alguém, que você ama, se aproxima, corra para saudá-lo. Quando houver necessidade, pratique a obediência. Deixe os outros saberem quando invadiram seu território. Sempre que puder, tire uma soneca e se espreguice antes de se levantar. Corra, pule, brinque diariamente. Coma com gosto e entusiasmo, mas pare quando estiver satisfeito. Seja sempre leal. Nunca finja ser algo que você não é. Se o que deseja estiver enterrado, cave até encontrá-lo. Quando alguém estiver passando por um mau dia, fique em silencia e sente-se próximo e, gentilmente, tente agradá-lo. Quando chamar a atenção, deixe alguém tocá-lo. Evite morder quando apenas um rosnado resolve. Nos dias mornos, deite-se de costas sobre a grama. Nos dias quentes, beba muita água e descanse em baixo de alguma arvore frondosa. Quando você estiver feliz, dance e balance todo seu corpo. Não importa quantas vezes você for censurado. Não assuma culpa que não tiver. E não fique amuado. Corra imediatamente de volta para seus amigos. Alegre-se com o simples prazer de uma caminhada. E lembre-se desse ditado que vem lá do Tibet.

Se seu problema tem solução então não há com que se preocupar e se seu problema não tem solução então para que se preocupar?

 

Encontro com a honestidade

 

Sonhei que me encontrei com a honestidade. Eu não a reconheci. Ela estava magra, os ossos a mostra, velha, acabada, corcunda, cheia de rugas, andando com dificuldade e doente, muito doente.

Fiquei preocupado e perguntei: Como vai?

Ela com uma voz rouca, fraca e tossindo muito: Cada dia estou mais desgostosa e desanimada. Ninguém me dá mais valor. Vivo perambulando, perdida como indigente pelas ruas. Só não peço esmola porque meu caráter não deixa. Nem no abrigo me aceitam. Vou acabar morrendo de fome e de frio, pois nenhuma pessoa mais alimenta as minhas esperanças e aquece meu coração com seu amor.

E eu disse: Poxa vida! Pare com essa mania de ser romântica.

Ela retrucou e disse: Romântica, eu?! Estou enjoada de ouvir que sou uma boba, uma otária, uma palerma. Sou humilhada todos os dias. Eu tenho certeza que meus dias estão contados. E o pior que não é isso que acontece com minha irmã gêmea. Ela está cada vez mais jovem, bonita, toda eufórica, entusiasmada, alegre, anda em trajes caros, cheia de jóias e com um carro do ano, comprou uma fazenda e tem dinheiro em paraísos fiscais.

E eu perguntei: Quem é essa sua irmã?

E a honestidade respondeu: É a desonestidade. Todos a admiram. Ela está na moda. Falam que ela é esperta. Ela sim, dizem, consegue tudo com muita facilidade. Dizem que ela sabe se virar. Eu não sei como fazer isso. Eu não sei, eu digo, sinceramente, nunca me interessei em saber da vida da minha irmã. Só sei que estou cada vez estou mais decadente, sem vontade de comer, sem qualquer gana de viver. É isso mesmo. Estou ficando tão enferma e fraca que entrei em coma e quase morri. Sim, eu acho que estou chegando ao fim, como uma velha triste e acabada, mas sabe que outro dia eu tive uma pequena esperança?

E eu, curioso, perguntei: O que aconteceu?

Ela respondeu: Uma velhinha muito podre e necessitada. Sabe essas que ficam remexendo no lixo? Ela achou um pacote com dez mil reais. Não ficou com o dinheiro e foi até a polícia. Incrível. Achou um rapaz, um investigador, que pegou o dinheiro, fez um boletim de ocorrência, procurou por muito tempo o dono do dinheiro e acabou não encontrando. Então ele foi até a casa da velhinha para devolver os dez mil reais, sem mexer em nada e disse que como ninguém o encontrou, o dinheiro pertencia á ela. Foi uma maravilha. Foi lindo mesmo. A velhinha ficou muito feliz mesmo, alegre, comovida e, por puro sentimento de gratidão, quis repartir o dinheiro com o policial encarregado daquela devolução, mas o policial não quis. Olha que coisa maluca. O policial disse que estava apenas cumprindo seu dever e que não poderia, como homem da lei, receber donativos. Ele alegou que jamais envergonharia sua corporação.

Notei o sorriso dela e perguntei: Aí você se animou, não?

Ela respondeu: Eu acho até que ressuscitei. Acordei do sonho da morte para viver. Senti dona de toda a esperança do mundo. Tomei um banho. Dei um jeito de me vestir decentemente. Saí toda animada novamente. Que alegria. Que satisfação. Haviam me dado valor. Finalmente eu estava afortunada e toda satisfeita.

Aí eu afirmei: Mas você está toda acabada e feia de novo. O que houve?

Ela respondeu: Mas o que é que é? Eu continuo digna de piedade. Estou em estado lamentável. Estou com os dias contados. Acho que nem Deus vai me receber mais.

Eu perguntei: Mas você não disse que estava feliz da vida?

A honestidade respondeu: Minha felicidade durou mais que uns minutos. Ao dobrar a esquina, vi um fiscal pegando as mercadorias de um vendedor ambulante. O coitado implora para que o fiscal fechasse os olhos, porque ele precisava trabalhar, pois tinha uma família para sustentar.

Eu indaguei a honestidade: Mas o fiscal estava apenas fazendo o trabalho dele, pois o ambulante estava em uma atividade ilegal.

A honestidade retrucou: É verdade, mas acontece que o fiscal liberou todas as mercadorias depois que recebeu um dinheirinho, uma propina. O fiscal botou o dinheiro no bolso e saiu feliz e contente enquanto o ambulante voltou a vender produtos contrabandeados.

Aí eu disse: Mas isso não se faz!

A honestidade deu um sorriso amarelo e afirmou: É verdade, mas a minha irmã, a desonestidade, deu pulos de alegria. Saiu caçoando e gritando para mim ‘Otária, você viu? É por aí, sua tonta! É assim que os espertos triunfam. Você é uma boba, uma maluca ao ficar buscando virtudes nos homens’. Aí eu caí em fulminante depressão. Desci do céu que estava até o mais profundo inferno. Em todo lugar, que ando, só vejo o trabalho da minha irmã. É roubo, corrupção, desfalque, golpes, seqüestros. Eu não consigo vencê-la. Caí em desgraça. Não comi mais, não dormi mais, não tomo banho há mais de um mês e aprendi a andar descalça. Eu consciente que estou caminhando dia a dia para a morte.

A honestidade me deus adeus e sumiu na avenida e aí eu acordei assustado. Liguei a TV. E o que estava passando nela? Mais uma sessão do conselho de ética do senado brasileiro.

 

FIM

 

 

















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