Mundo particular

Ficwriter: Jude Melody
Sakura Card Captor - romance - original
livre - completa


A chuva despencou sobre a cidade, cobrindo-a com um véu de água. Sakura disparou pelas ruas, levantando os braços em vão. Nada do que fizesse poderia protegê-la. Estava encharcada até a alma, e suas pernas tremiam por conta do frio.

- Cuidado!

Ela caiu em uma poça no chão, ensopando ainda mais sua pobre alma. Sentou-se com dificuldade, massageando o braço que amortecera a queda. A dor era fraca, mas incômoda. Estava tudo dando tão errado naquele dia! A garota sentiu vontade de chorar.

- Sakura-san? – chamou uma voz gentil.

Ela ergueu o rosto. Os cabelos estavam grudados em sua testa, e a chuva que escorria por eles caía sobre seus olhos, dificultando sua visão. Envergonhada, jogou a franja para o lado e arriscou encarar o jovem em que esbarrara durante sua fuga.

- Está tudo bem? – perguntou Shaoran, estendendo o braço.

- Shaoran-kun! Me-me desculpe! Eu...

- Tudo bem. Não machucou. – ele abriu um sorriso – Venha.

- E-está bem.

Sakura segurou a mão que Shaoran lhe estendia e deixou que ele a levantasse. Ainda massageando o braço, observou o garoto discretamente. Ele não caíra no chão, mas estava tão encharcado quanto ela.

- A chuva também te pegou desprevenido? – ela indagou.

- Na verdade...

Shaoran desviou o rosto, tímido. Sakura seguiu seu olhar, curiosa com aquela reação. Qual não foi sua surpresa ao ver um guarda-chuva verde em uma poça a alguns metros de distância! A vergonha dominou-a por completo. Não só esbarrara no garoto, como ainda fizera o guarda-chuva voar para longe de sua mão!

- Eu pego. – disse, afastando-se do amigo.

O vento, porém, conspirou contra a jovem garota. Com uma forte lufada, soprou o guarda-chuva para longe. O objeto rodopiou pelo ar, lançando-se em direção ao infinito.

- Não! – Sakura exclamou, estendendo o braço bom – Volte aqui!

- Sakura, cuidado!

Shaoran abraçou por trás, obrigando-a a se agachar. Uma placa de metal passou a poucos centímetros do rosto de Sakura, assustando-a. Com um grito, ela se voltou para o garoto que a salvara, os olhos ainda arregalados pela surpresa.

- Desculpe... – ele disse, ainda a envolvendo pela cintura.

- Tu-tudo bem!

Eles ficaram de pé. Os dois sem jeito por conta do toque tão íntimo. Eles eram amigos há meses, mas abraços não lhe eram comuns. Sakura abaixou a cabeça, encarando as sapatilhas encharcadas. Shaoran virou o rosto, desejando esconder o rubor de suas bochechas.

- Melhor sairmos daqui. – disse a garota.

- Sim. – ele se limitou a concordar.

Os dois correram pela rua, lutando contra o vento. Não havia nenhuma loja aberta nas proximidades, e eles não sabiam se conseguiriam chegar inteiros a suas casas. Sakura avistou uma estrutura azul familiar e fez um sinal para que Shaoran a seguisse. Juntos, eles dirigiram-se ao parque e se abrigaram sob o escorrega de pinguim.

- Estamos... a salvo... – ela arfou, exausta pela corrida.

- Acho que sim... – ele se encostou à parede, trêmulo de frio.

Não havia mais nada que pudessem fazer. Sentaram-se no chão. Ela, abraçando as pernas e apoiando o queixo nos joelhos. Ele, de pernas e braços cruzados.

- Shaoran. – ela chamou.

- Sim?

- Está com frio?

O garoto virou o rosto, envergonhado.

- Um pouco.

O vento invadiu o abrigo, roubando a paz dos dois amigos. Em meio à sua agonia, Sakura dirigiu um olhar choroso a Shaoran, que fazia uma careta para aquela adversidade. Seu rosto era cruelmente castigado pela chuva, mas ele se mantinha corajoso. Aquela coragem de alguma forma inspirou a garota.

Ela abriu a bolsinha que trazia a tiracolo e retirou dali algumas cartas rosadas. Analisou-as uma a uma até encontrar a que procurava. Com um sorriso no rosto, retirou seu colar, revelando um pingente de estrela.

- Chave que guarda o poder da minha estrela...

Shaoran virou o rosto para ela imediatamente. De súbito, parecia fascinado pela garota diante de si. Como se a magia dela o hipnotizasse. Ou, talvez, como se a própria Sakura o hipnotizasse.

- Mostre seus verdadeiros poderes sobre nós e ofereça-os à valente Sakura que aceitou esta missão.

O pingente brilhou em seus dedos, parecendo ele próprio uma pequena estrela na terra.

- RELEASE!

Sakura girou o báculo com apenas uma das mãos, deleitando-se com a sensação da magia em seus dedos. Fitou a carta que separara segundos antes.

- Shield!

Uma camada semelhante a vidro envolveu os dois, abafando a chuva lá fora. Eles tinham seu próprio mundo agora. Um mundo no qual ninguém poderia importuná-los.

- Prontinho! – Sakura abriu um largo sorriso.

Shaoran sorriu também, mas de forma tímida. Ele deixou seu olhar recair sobre o braço direito da garota. Ela não o usara para ativar o báculo.

- Por que não está usando o braço direito?

- Ah, é que eu... – agora era ela quem estava corando – Caí em cima dele naquela hora em que esbarrei em você e...

- Deixe-me ver.

O garoto aproximou-se, tocando seu braço de leve. Sakura deixou escapar um pequeno resmungo de dor. Mas não era isso que a estava incomodando. Era a curta distância entre ela e Shaoran, uma distância que fazia seu coração bater acelerado.

- Posso? – ele perguntou.

Eles ficaram quietos por um breve segundo. Olhos nos olhos. Calmamente, Sakura assentiu.

- Sim.

Shaoran retirou um pedaço de pergaminho do bolso da calça e murmurou um encantamento. Parecia uma cantiga, como aquelas que as mães murmuram para embalar o sono de suas crianças. A dor diminuiu lentamente, até deixar de existir.

- Pronto. – Shaoran abriu um sorriso.

- Obrigada. – Sakura sorriu também.

O silêncio fez-se presente. Não havia necessidade de palavras naquele momento mágico. Os dois ficaram quietos, juntos, curtindo a companhia. Ficaram em seu pequeno mundo particular, esperando o vento parar de rugir lá fora.

- Parece que parou de chover. – disse o garoto.

- É mesmo. – ela concordou, espiando o parque.

- Vamos para casa?

- Vamos.

A camada de vidro desapareceu, abrindo um portal para a realidade. Shaoran saiu do abrigo e depois estendeu a mão para ajudar Sakura a se levantar. Ela enlaçou seus dedos e abriu um meio sorriso.

Eles se afastaram logo depois, constrangidos.

- Então, eu... Acho que vou te acompanhar até em casa. – ele murmurou.

- Não precisa!

Mas ela queria e não se opôs quando Shaoran insistiu. Juntos, caminharam até a casa dela. Juntos, hesitaram durante a despedida. Juntos, trocaram algumas palavras enquanto sorriam sem jeito.

- Nos vemos na escola amanhã? – ela indagou, cheia de expectativa.

- É claro. Sakura-san.

Ele acenou para ela e foi embora. Sakura inspirou fundo, inebriada pela felicidade. Ainda podia sentir a magia das cartas em suas mãos. Ou talvez fosse apenas o nervosismo provocado pela recente aventura. Ela não sabia dizer.

 

 

















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